11 de junho de 2009

ESPECIALISTAS LEMBRAM PANDEMIAS DO PASSADO

Gripe A H1N1: O pior vai ou não acontecer?
24.05.2009 - 11h51 Ana Gerschenfeld
O novo vírus da gripe, que galvaniza as notícias há semanas, é um descendente directo do vírus que causou a maior pandemia de sempre da história da humanidade, a "mãe de todas as pandemias", como dizem alguns: a gripe espanhola de 1918.
Estará a história prestes a repetir-se?
Adela Gutiérrez tocou à campainha de uma modesta residência. O seu dia de trabalho estava quase a acabar - e ainda bem, porque Adela sentia-se muito doente. A constipação que tinha apanhado há mais de uma semana continuava a piorar. Mas como era uma inspectora dos impostos empenhada na sua tarefa - e talvez também porque os seus superiores teriam torcido o nariz se ficasse em casa por uma insignificância -, Adela tinha continuado a fazer as suas visitas porta a porta dentro e fora da cidade de Oaxaca, no Sul do México, onde vivia. Só que nesse fim de dia já não aguentava o cansaço, as dores musculares, os arrepios, a dor de cabeça lancinante que não parava, as noites a fio sem conseguir dormir. Tinha febre. Andava a tomar antibióticos há cinco dias, receitados por um médico particular para tratar a dor de garganta que tinha aparecido no meio disto tudo, mas o medicamento não parecia estar a fazer efeito. Felizmente que o dia seguinte era o feriado de quinta-feira santa. Ia finalmente poder enfiar-se na cama e descansar.


O que Adela não sabia é que, ao longo de todos esses dias, um perigoso micróbio tinha irremediavelmente invadido o seu organismo. Um vírus totalmente novo, que o seu organismo nunca tinha encontrado e contra o qual não tinha quaisquer defesas.


Enquanto esta jovem mulher de 39 anos completava a sua ronda, ao nível microscópico o vírus completava ciclos e ciclos de replicação. As partículas virais que tinham dado origem à infecção e que Adela tinha inalado, à boleia de minúsculas partículas de saliva suspensas no ar, vindas da expiração, da tosse ou dos espirros de outra pessoa infectada com quem se tinha cruzado ao acaso das suas andanças, não tinham parado de multiplicar-se freneticamente e eram agora milhões - nos seus pulmões, na sua garganta, no seu nariz. As células da parede dos seus brônquios não tinham oferecido grande resistência às proteínas virais encarregadas de incrustar os vírus na sua membrana para libertar dentro delas o seu material genético. E a partir daí o mal estava feito: outras proteínas faziam inúmeras réplicas dos genes do vírus dentro da célula, como autênticas fotocopiadoras; a seguir os genes eram muito bem empacotados dentro de invólucros proteicos individuais e, uma vez os embrulhos prontos, zarpavam em direcção à membrana celular, onde formavam protuberâncias que se transformavam em novas partículas virais. Uma última proteína encarregava-se, no fim deste processo, de cortar as amarras das novas partículas, ainda presas à membrana celular, libertando-as e lançando estas invisíveis bolinhas (com apenas cem milionésimos de milímetro de diâmetro) à conquista de novos alvos. Uma a uma, as células que permitiam que Adela respirasse iam morrendo, numa cascata imparável de infecção e inflamação.


A primeira vítima.
No dia seguinte, Adela não foi capaz de ficar em casa a descansar. Mal conseguia aspirar para dentro dos pulmões o ar do qual a sua sobrevivência dependia - a tal ponto que tinha as pontas dos dedos azuis, por falta de oxigénio. O marido, Luis Ramírez, contaria mais tarde a um grupo de jornalistas que tinha chamado uma ambulância, mas que, como o transporte demorava a chegar, ele e as filhas tinham optado por levar Adela no carro familiar até às urgências do grande hospital público de Oaxaca. Aí, tiveram ainda de esperar três horas para Adela poder ser vista pelos médicos. E não havia cama nem ventilador disponíveis. Quatro dias depois, na tarde de 13 de Abril, Adela morria nos cuidados intensivos do hospital, afogada nos seus próprios fluidos. Os médicos diriam ao marido que a sua mulher tinha sucumbido a um vírus desconhecido. Tinham de facto detectado, nos testes que lhe fizeram, um vírus invulgar, contra o qual nenhum tratamento funcionara. Como relataria o New York Times, que falou com eles e visitou mais tarde o hospital, os médicos declararam um alerta epidemiológico três dias mais tarde, com base no caso de Adela e outros semelhantes.


A 20 de Abril, os EUA notificaram o México de que tinham sido detectados na Califórnia dois casos de gripe com componentes humana e porcina e, a 22 de Abril, as autoridades mexicanas enviaram amostras biológicas colhidas em Adela e em outros doentes (incluindo um rapazinho de quatro anos, da aldeia de La Glória, que sobreviveu à doença), ao Laboratório Nacional de Microbiologia de Winnipeg, Canadá - um dos dois no mundo com capacidade para detectar este tipo de vírus. Um dia depois, tinham o veredicto e Adela tornava-se oficialmente a primeira vítima mortal de um novo tipo de gripe.


Ataque em vagas.
"Você nota uma dor de cabeça difusa. Os seus olhos começam a arder. Tem arrepios e deita-se na cama, o corpo feito numa bola. Não há cobertores que cheguem para o aquecer. Adormece, mas o seu sono é agitado por pesadelos típicos do delírio, à medida que a febre sobe. E, quando acorda, é para uma espécie de estado semiconsciente, com os músculos doridos e uma dor de cabeça atroz. (...) Isto pode durar uns dias, ou algumas horas, mas não há nada a fazer para travar o avanço da doença. (...) Com o rosto a virar roxo acastanhado, você começa a cuspir sangue. Os seus pés tornam-se pretos. Perto do fim, tenta desesperadamente respirar. Uma espuma de saliva tingida de sangue escorre da sua boca. Você morre - de facto, afoga-se - à medida que os seus pulmões se enchem de um líquido avermelhado."


O paralelo entre a lenta agonia de Adela e esta descrição não escapa a ninguém. Só que não é dela que se trata, mas da descrição genérica de um caso de gripe espanhola, extraída do livro de Gina Kolata, jornalista do New York Times, sobre a pandemia de gripe que varreu o mundo há 90 anos, no fim da I Guerra Mundial, intitulado Flu: The Story of the Great Influenza Pandemic of 1918 and the Search for the Virus that Caused It e publicado em 1999. Mas é de admitir que, nas suas linhas gerais, estas frases poderiam aplicar-se ao que aconteceu a Adela há pouco mais de um mês, no início do que poderá vir a ser uma nova pandemia de gripe.


As potenciais semelhanças entre a epidemia de nova gripe que se declarou há semanas no México e nos EUA e a pandemia de gripe do início do século XX não se ficam por aí. A julgar pela demografia das hospitalizações devido a problemas respiratórios, o novo vírus tem demonstrado uma forte propensão para infectar pessoas jovens e de boa saúde, tal como aconteceu em 1918 - o que não é habitual nos surtos ou epidemias de gripe sazonal, que são aquelas que surgem no Inverno e que põem em risco de vida sobretudo as crianças muito pequenas e as pessoas idosas ou de fraca imunidade.


Por enquanto, a nova gripe tem, contudo, dado mostras de ser, globalmente, bastante suave. De facto, Adela era diabética, donde particularmente vulnerável a diversas doenças, o que poderá explicar o trágico desfecho de casos como o seu. Mas essa relativa "benignidade" do vírus pode ser apenas uma miragem. Não é possível ignorar que a gripe espanhola também surgiu, primeiro, durante a Primavera de 1918, e também sob uma forma muito mais suave. Só revelaria a sua verdadeira personalidade a partir de Setembro de 1918, acabando por matar entre 20 milhões e 100 milhões de pessoas no mundo, segundo as diversas estimativas. As pandemias têm essa característica: vêm por vagas, começam suavemente uns meses antes e dão o golpe de misericórdia mais tarde - por vezes repetidamente. Será esta a primeira vaga de algo muito mais assustador? Serão casos como o de Adela um prenúncio do que ainda está para vir? Actualmente, não é ainda possível saber com certeza se a história de terror de 1918 se vai repetir - se uma praga como essa, que "fez mais mortos em poucos meses do qualquer outra doença na história do mundo", como escreve ainda Gina Kolata, está ou não às nossas portas.


Hoje como ontem?
Alguns cientistas já avançaram cenários possíveis. Neil Ferguson, do Imperial College de Londres, e colegas, por exemplo, publicaram há dias um artigo na edição online da revista Science onde estimam, com base nos dados disponíveis que, embora não chegue a ser tão mortífera como a gripe espanhola, a actual epidemia tem potencial para se transformar numa pandemia comparável à da gripe asiática de 1957, que vitimou mais de dois milhões de pessoas no mundo. A título comparativo, a gripe sazonal mata, todos os anos, cerca de meio milhão de pessoas (mesmo assim, um número assustador), a maior parte nos países mais pobres.


Outros cientistas têm andado a dissecar os genes do vírus para determinar a sua perigosidade - e as suas conclusões têm sido animadoras. A equipa de Wendy Barclay, do Imperial College de Londres, diz por exemplo que a nova estirpe parece ser das que infectam as vias respiratórias superiores (nariz, garganta, traqueia, brônquios primários), provocando por isso sintomas mais ligeiros do que as estirpes com propensão para infectar os pulmões. Tom Slezak, especialista de bioinformática do Laboratório Lawrence Livermore, nos EUA, analisou padrões de pequenas variações no material genético do vírus e especula que esta epidemia pode acabar por não ser muito grave. Andrew Rambaut, da Universidade de Edimburgo, e outros estimaram, a partir dos genes do novo vírus, que ele poderá ter na realidade surgido meses antes de ser detectado, o que significaria que não está a espalhar-se assim tão furiosamente.


Uma nota de maior prudência, neste coro alentador. "Acho muito, muito difícil fazer previsões, porque não fazemos ideia do número de pessoas infectadas pela nova gripe e é portanto impossível calcular a taxa de mortalidade do novo vírus", disse por seu lado ao P2 Mark Miller, epidemiologista dos National Institutes of Health norte-americanos, em conversa telefónica. "As pandemias do passado vêm de facto por vagas, e entretanto o vírus pode mudar e tornar-se menos patogénico e desaparecer - ou, pelo contrário, mais patogénico. Mas temos tão pouca experiência disto que não conseguimos dizer o que vai acontecer neste caso."


Radiografia de um vírus.
Os vírus da gripe são muito primitivos. O seu património genético nem sequer está codificado dentro de uma dupla hélice de ADN, como o nosso - mas apenas numa simples hélice de ARN. Ora, ao contrário do ADN, o ARN não possui os mecanismos de correcção de erros, de "gralhas", causados pela sua replicação - portanto, de cada vez que faz cópias de si próprio, surgem mutações. É essa mutabilidade dos vírus da gripe que os torna extremamente imprevisíveis.


A maior parte das vezes, essas mudanças são pequenas, fazendo com que o vírus só gradualmente se vá tornando diferente dos seus antecessores. Mas, mesmo assim, os especialistas vêem-se obrigados a repensar todos os anos a composição da vacina contra a gripe sazonal do ano seguinte. Porque a do ano anterior já não nos protege tão bem, uma vez que o vírus já não é bem o mesmo.


Os vírus da gripe têm uma outra originalidade, que lhes confere a capacidade de sofrer mudanças ainda maiores: o seu ARN nem sequer é uma simples molécula; é, pelo contrário, composto de oito fragmentos separados, cada um deles a comandar o fabrico de uma ou duas proteínas virais (11 no total). Assim, embora só se verifique muito mais raramente (três ou quatro vezes por século), a mudança sofrida pelo vírus pode ser muito mais radical, com duas estirpes de vírus a dar origem, literalmente por mistura genética, a uma terceira, totalmente diferente de ambas. Isto acontece nomeadamente quando dois vírus da gripe infectam ao mesmo tempo um mesmo porco, porque têm então mais facilidade em trocar entre si esses seus pedaços inteiros de material genético. O resultado, totalmente inédito, tem o potencial de ser devastador. É aí que nascem as pandemias.


Duas proteínas.
Tal como o vírus de 1918, o novo vírus da gripe é uma estirpe de vírus "de tipo A e de subtipo H1N1". Basicamente, os vírus da gripe, que são capazes de infectar uma série de espécies animais, entre as quais porcos, aves e humanos, podem ser de tipo A, B ou C, sendo o tipo A o único com potencial pandémico (o tipo C não infecta os seres humanos).


Entre os vírus de tipo A, contam-se vários subtipos, cuja designação é definida por duas das proteínas fabricadas pelo vírus: a hemaglutinina, HA, que lhe permite incrustar-se na membrana das suas células-alvo, e a neuraminidase, NA, que permite que os vírus recém-formados se soltem da membrana e abandonem a célula onde foram criados. As características destas duas proteínas, que se encontram à superfície dos vírus, condicionam em grande parte a forma como o nosso organismo vai reagir contra um dado vírus - e, por isso, dá-se aos vírus da gripe A nomes como A H1N1, A H2N3 ou A H5N1.


Se uma pessoa for imune às proteínas HA ou NA de uma dada estirpe do vírus, ou seja, se tiver anticorpos contra elas, esse vírus particular será menos perigoso para essa pessoa. É exactamente para isso que servem as vacinas sazonais contra a gripe (e mais geralmente todas as vacinas): ao desafiar a nossa imunidade com versões atenuadas das estirpes do vírus da gripe que mais circulam entre nós a dada altura, incitam o nosso sistema imunitário a fabricar anticorpos que nos protegerão contra os ataques do verdadeiro vírus.


Assim, por exemplo, a vacina da gripe da temporada 2008-2009 continha componentes de uma estirpe particular de vírus da gripe A H1N1 humana. Infelizmente, ela pouco ou nada tem nada a ver com a estirpe A H1N1 da nova gripe - seria bom que tivesse, porque seríamos então relativamente imunes à nova doença.


Quando temos de nos defrontar com um vírus que o nosso sistema imunitário nunca viu na vida, não temos anticorpos, defesas imunitárias, para lhe fazer face. Daí o receio dos especialistas, de há uns anos para cá, em relação ao vírus da gripe das aves, que não é de tipo A H1N1 como o actual, mas de tipo A H5N1. Não é um vírus que passe facilmente para os humanos (é uma gripe das aves, não dos humanos), mas quando isso acontece é extremamente letal, matando cerca de 50 por certo das suas vítimas. Imagine-se o que aconteceria se, ao recombinar-se dentro de um porco com um vírus humano, ela passasse a transmitir-se entre nós como os vulgares vírus da gripe humana, de cada vez que espirramos ou tossimos. É fácil perceber a catástrofe que isso significaria...Desta vez, isso não aconteceu, como se receava, com o vírus A H5N1 das aves, mas com um vírus A H1N1 suíno. E não aconteceu no Sudeste asiático, como se receava, mas na América do Norte. E ainda pode ser que não seja assim tão grave... ou talvez sim.


Confusão de nomes.
Muito se falou e debateu sobre os possíveis nomes a dar à nova gripe. Mas existe um problema de fundo com o nome finalmente escolhido pela Organização Mundial de Saúde, entre outras coisas para agradar aos suinicultores - e que em Portugal foi adoptado por quase todos sem pensar duas vezes. É que esse nome cria ainda mais confusão na nomenclatura - e nas pessoas.


A denominação "oficial" que está a ser utilizada faz com que muitas estirpes do vírus, que na realidade são totalmente diferentes, mereçam o mesmo nome. Sem ir mais longe: o nome do vírus da nova gripe é igual ao nome de um dos vírus da gripe sazonal 2008-2009: A H1N1. Por que será então que não temos imunidade contra este novo vírus, se ele tem o mesmo nome dos habituais vírus da gripe sazonal? Poder-se-á perguntar. E pergunta-se."A H1 e N1 porcinas são diferentes da H1 e N1 humanas", disse ao P2, por email, Steven Salzberg, especialista de bioinformática da Universidade de Maryland. E explica o porquê dessa aparente - e enganadora - identidade entre os dois vírus: "É muito confuso, eu sei, mas tem alguma razão de ser: o vírus A H1N1 dos porcos [o da nova gripe] é um descendente da gripe de 1918, tal como o vírus A H1N1 humano." Só que as semelhanças acabam aqui; trata-se na realidade de dois primos muito afastados - por 90 anos de evolução, mais precisamente. "[A nova gripe] tem estado a circular exclusivamente entre os porcos nos últimos 90 anos", salienta Salzberg. "As respectivas estirpes [H1N1 humana e H1N1 suína] tornaram-se portanto muito, muito diferentes. E o resultado é que o nível de protecção cruzada de que poderemos beneficiar [por causa da nossa imunidade contra as estirpes A H1N1 humanas] é muito baixo - e muito provavelmente inexistente." Talvez algumas pessoas mais idosas possam ter alguma imunidade, mas a maior parte da população mundial jamais se cruzou com o novo vírus.


É mesmo uma gripe suína.
A genealogia do vírus é complexa. "De facto, a actual estirpe de nova gripe teve muitos antepassados. Mas o evento mais recente - e o mais relevante - foi um rearranjo genético de duas estirpes de vírus suínos, e foi isso que conduziu ao novo surto", explica-nos ainda Salzberg. Por outras palavras - e é preciso aceitar essa realidade -, a nova gripe é de origem suína, quer os suinicultores gostem, quer não. Não é por acaso, aliás, que virtualmente toda a imprensa britânica e norte-americana continua a falar irreverentemente em swine flu - e que todos os artigos científicos referem a "gripe A H1N1 de origem suína". O lado suíno da gripe é fundamental. Chamar-lhe simplesmente "gripe A H1N1" não conta a história toda. Aliás, os mais recentes resultados da análise genética do vírus, publicados anteontem na edição online da Science, sugerem mais fortemente do que nunca que o novo vírus terá efectivamente surgido, algures no mundo, em populações de suínos, onde terá passado despercebido durante anos.


Mesmo assim, o novo vírus herdou de um dos seus dois antepassados de origem suína dois genes de origem aviária, resultado de uma anterior evolução desse antepassado - mais precisamente, dois dos três genes que lhe servem para replicar o seu material genético dentro das suas células-alvo. E, segundo explicava há dias a New Scientist, os peritos receiam que estes dois genes lhe confiram grande eficácia na replicação - e portanto maior virulência.


Resumindo:
o novo vírus da gripe, que não é novo nos porcos, mas apenas nos humanos, "saltou" de repente para a nossa espécie. É um descendente directo do vírus responsável pela pandemia de gripe de 1918, a que alguns chamam "a mãe de todas as pandemias" pelo seu efeito devastador - e possui genes aviários que o podem tornar mais agressivo. E como não temos estado em contacto com ele nas últimas décadas, porque tem permanecido circunscrito aos suínos, não temos praticamente nenhuma imunidade contra ele.


Mundo mais preparado.
Nestas condições, o que poderá acontecer a seguir? Ninguém sabe nem deseja realmente apostar no cenário mais optimista, a julgar pelo empenho que as autoridades de saúde nacionais e internacionais têm demonstrado em lidar com a potencial pandemia antes de saber se é ou não uma pandemia - nomeadamente em termos do fabrico de uma vacina contra o novo vírus. "As vacinas são o melhor seguro que temos contra qualquer eventualidade e parece uma precaução básica fabricar uma vacina contra o novo vírus", frisa Mark Miller. Vai-se portanto fabricar uma nova vacina - e, embora ela talvez não chegue a tempo para o início de uma eventual segunda vaga, irá sem dúvida permitir salvar muitas vidas nos países mais favorecidos. Mas o que acontecerá nos países mais pobres, se o que está para vir for de facto uma pandemia? Naqueles países onde, todos os anos, já se contam 96 por cento das vítimas mortais da vulgar gripe sazonal?


Por outro lado, é óbvio que, pelo menos nos países ricos, os sistemas de saúde melhoraram radicalmente desde a pandemia de gripe espanhola. Naquela altura, pensam hoje os especialistas, uma grande parte das vítimas terá sucumbido a outras infecções, nomeadamente bacterianas (e não havia antibióticos) e não directamente ao vírus. E se tivesse havido mais ventiladores e cuidados médicos adequados, ter-se-iam poupado ainda mais vidas. Também não se pode ignorar o facto de que, na altura, o mundo estava a sair de quatro anos de guerra e de penúrias de todo o tipo, que tinham minado seriamente a saúde das populações. A actual situação é no mínimo um sinal de alarme e no máximo... uma pandemia. De facto, olhando para as estatísticas mundiais da infecção, cabe perguntar se não terá chegado a altura de chamar as coisas pelo seu nome e anunciar que se trata efectivamente de uma pandemia declarada.

Sem comentários:

Enviar um comentário